22 de out. de 2008

Banquete

Depois de um longo inverno de privações, Mosquito levou a família para comer fora. Os veranistas estavam invadindo o litoral como nuvens de gafanhotos, o que significava uma imensidão de carnes brancas e tenras à livre escolha. Isso era a própria visão do paraíso para quem havia passado os últimos meses se alimentando dos pescadores locais com seus corpos magros, as peles torradas e extremamente salgadas.
Mosquito e sua prole esperaram o sol se pôr e, naquela hora em que todos da sua espécie saem voando e devorando por aí, passearam de rua em rua até decidir onde iriam comer. Os moradores sentados na frente das casas facilitavam as coisas, parecendo menus de restaurantes fixados nas calçadas. Será que os borrachudos e os pernilongos, primos do Mosquito que moravam em outros estados, também tinham tanta fartura?
Uma perna pendurada do lado de fora de uma rede abriu o apetite da Mosquita, que nem estava com tanta fome assim. Nessa mesma casa, crianças corriam soltas pela grama e um bebê dormia no carrinho - sangue puríssimo, um néctar dos deuses. Já que o ambiente parecia limpo e familiar, a decisão estava feita. Humanos, aqui vamos nós.
Mosquito recomendou que os filhos evitassem carnes de pescoço e avisou para que tivessem muito cuidado com os tapas. Conhecidos de outras praias já o preveniram de que os veranistas estavam particularmente violentos nesse ano. E as crianças que não aceitassem nada estranho para cheirar. Se todos se comportassem, poderiam repetir a sobremesa.
Depois, o casal de mosquitos escolheu um recanto mais afastado onde o pessoal jogava cartas e foi para baixo da mesa. Enfim, sós. Ficaram ali conversando. Logo iriam mordiscar um pé ou uma canela. Falaram do futuro, fizeram planos de tentar a vida na cidade antes que os primeiros ventos do inverno soprassem. Quando alguém cruzou uma perna e bateu a fome, Mosquito e Mosquita se serviram de todas as carnes que encontraram. E sentiram nojo. Custava tirar o protetor solar da pele? Gente porca, eu hein.


Um comentário:

Unknown disse...

bom eu leio seu textos faz uma semana nunca fui muito da leitura, mas quando entrei no seu blog e li amei leio todos os dias, suas historias são sempre diferentes e de uma angulo que nunca me passa na cabeça, obrigada pelo minutos de reflexão e risadas.odeio mosquitos tenho alergia a eles heheh
bju