Eu sempre quis fazer cinema. Mais especificamente, fazer figuração num filme de catástrofe onde uma multidão de habitantes vaga desorientada pelas ruas de uma cidade vazia e tomada pelo caos.
Acho lindo aquele balé do horror, especialmente quando Hollywood não economiza na locação e manda a fila seguir desolada por uma estrada sem fim. Adoro observar os olhares atônitos, os passos cambaleantes, as roupas esfarrapadas e imagino a força sobrenatural que esses coitados fazem para descobrir qual é o próximo passo. Literalmente. Caminhar para o Norte? Seguir em direção ao Sul? Almoçar em que horário?
Sempre me perguntei como o diretor consegue coordenar esse bando de gente. Não deve ser mérito do megafone. Nem dos assistentes, que provavelmente vão estar ainda mais perdidos no set. Então cheguei à conclusão de que, se é para ser caótico, o diretor finge que dirige e os 2 mil figurantes fingem que obedecem. Já que o clima é de fim de mundo, o instinto vai falar mais alto e cada um vai cuidar da sua vida – ou o que resta dela.
Foi assim que eu vislumbrei um novo mercado de atuação: o da figurante-líder.
Se um exército de zumbis mutantes estivesse no seu calcanhar, você não gostaria de encontrar alguém que corresse na frente e apontasse “é por aqui”? Se um vírus letal contaminasse todo o ar do planeta, você não adoraria achar alguém que tivesse uma máscara extra de oxigênio – outro dia eu conto dos souvenirs roubados dos aviões nas filmagens da Varig, Varig, Varig.
Com minha vasta experiência na publicidade, eu poderia ser essa líder. Deve ser por isso que emocionei vendo Ensaio Sobre a Cegueira. Com o perdão do trocadilho, enxerguei tantas possibilidades de atuação. Olhando (desculpe) sob a ótica (ai) da figuração, faltou foco (putz). Na cena do supermercado, por exemplo. Eu poderia ter ajudado aqueles mortos de fome a saquearem com mais veracidade as prateleiras. Por que ninguém procurou comida no depósito lá embaixo? Falta de visão (última vez) dos figurantes! E no começo do filme, na cena do engarrafamento? Eu, que atravessei tantas ruas e abri tantas portas em comerciais de carro, poderia teria ajudado a compor o caos urbano. E o que eu vi (sorry) em cena? Uma figuração conformada demais. Nem vou comentar a falta de uma líder nas cenas da quarentena. Se não fosse a Julianne Moore, a figuração estaria perdida. Minha cabeça fervilha. Preciso usar todos esses insights, nem que seja num comercial de catarata ou glaucoma. Vou ligar para a agência de modelos agora mesmo. Topo até dilatar a pupila.
Acho lindo aquele balé do horror, especialmente quando Hollywood não economiza na locação e manda a fila seguir desolada por uma estrada sem fim. Adoro observar os olhares atônitos, os passos cambaleantes, as roupas esfarrapadas e imagino a força sobrenatural que esses coitados fazem para descobrir qual é o próximo passo. Literalmente. Caminhar para o Norte? Seguir em direção ao Sul? Almoçar em que horário?
Sempre me perguntei como o diretor consegue coordenar esse bando de gente. Não deve ser mérito do megafone. Nem dos assistentes, que provavelmente vão estar ainda mais perdidos no set. Então cheguei à conclusão de que, se é para ser caótico, o diretor finge que dirige e os 2 mil figurantes fingem que obedecem. Já que o clima é de fim de mundo, o instinto vai falar mais alto e cada um vai cuidar da sua vida – ou o que resta dela.
Foi assim que eu vislumbrei um novo mercado de atuação: o da figurante-líder.
Se um exército de zumbis mutantes estivesse no seu calcanhar, você não gostaria de encontrar alguém que corresse na frente e apontasse “é por aqui”? Se um vírus letal contaminasse todo o ar do planeta, você não adoraria achar alguém que tivesse uma máscara extra de oxigênio – outro dia eu conto dos souvenirs roubados dos aviões nas filmagens da Varig, Varig, Varig.
Com minha vasta experiência na publicidade, eu poderia ser essa líder. Deve ser por isso que emocionei vendo Ensaio Sobre a Cegueira. Com o perdão do trocadilho, enxerguei tantas possibilidades de atuação. Olhando (desculpe) sob a ótica (ai) da figuração, faltou foco (putz). Na cena do supermercado, por exemplo. Eu poderia ter ajudado aqueles mortos de fome a saquearem com mais veracidade as prateleiras. Por que ninguém procurou comida no depósito lá embaixo? Falta de visão (última vez) dos figurantes! E no começo do filme, na cena do engarrafamento? Eu, que atravessei tantas ruas e abri tantas portas em comerciais de carro, poderia teria ajudado a compor o caos urbano. E o que eu vi (sorry) em cena? Uma figuração conformada demais. Nem vou comentar a falta de uma líder nas cenas da quarentena. Se não fosse a Julianne Moore, a figuração estaria perdida. Minha cabeça fervilha. Preciso usar todos esses insights, nem que seja num comercial de catarata ou glaucoma. Vou ligar para a agência de modelos agora mesmo. Topo até dilatar a pupila.
(continua - tá acompanhando a saga da figurante Maria?)
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