Mataram a rotina. Um vaso de cristal arremessado por trás, um golpe certeiro na cabeça. O assassinato foi premeditado num entediante almoço de domingo. A família se livrou ao mesmo tempo da rotina e do vaso que ninguém gostava. Como julgar pessoas que agiam em legítima defesa?
A partir daquele momento, nenhum dia seria igual ao outro. As manhãs poderiam começar com o jantar e terminar a noite com o lanche da tarde. Os armários da cozinha guardariam as toalhas de banho. A banheira estava livre para virar estante de livros. Alguém deu idéia de colocar grama na escada. E quem quisesse transformar a sala em quarto ou dormir com a cabeça nos pés da cama não precisava explicar por quê.
A ordem era esquecer a rotina, usar a louça de festa em dia comum e acender o abajur quando ainda não precisava. Se quisessem tomar sopa com garfo, bom para eles. Se inventassem de pendurar um quadro na geladeira ou de ter um sapo de estimação, nada contra. Só não podiam comer carne de panela toda terça-feira. Nem fazer o mesmo caminho para o trabalho, nem viajar para os mesmos lugares, nem ficar nos mesmos hotéis, nem tirar as mesmas fotos, nem cortar o cabelo do mesmo jeito, nem contar as mesmas piadas, nem usar as mesmas desculpas, nem repetir tantas frases iguais.
Com o tempo, mais combinações foram feitas. Naquela casa, os aniversários seriam comemorados em outros dias. E não valia cantar de novo o Parabéns. Quem sabe o Jingle Bells, talvez o hino do Brasil para variar. Bandeirinhas de São João poderiam ser hasteadas no teto – estava todo mundo cansado de encher balão. No meio da mesa, bolo de carne com velinhas. Ou torta de ervilha. Senão, uma mesa reservada em um restaurante que ninguém conhecia. De convidados, os estranhos da mesa ao lado. Mas poderiam também ser os velhos conhecidos com presentes novos. Um pé de pato para nadar na serra. Um aquário para o gato. Um poema escrito em papel de presente. Um brinquedo de criança para quem virou adulto demais.
Depois que todos enlouqueceram tudo, a casa ficou parecida com um circo. O marido achava que era a mulher, a mulher não achava mais seus brincos. Os filhos queriam ver um pouco de TV, aquela coisa comum de apertar o botão e trocar o canal. Então a família percebeu que estava com saudade da rotina. Até porque dormir com cobertor no verão e ventilador no inverno não era tão divertido assim. Sem falar que os sonhos mudavam tanto que a cabeça já não descansava. Então num almoço de domingo, o pai olhou para a lasanha de frutas, voltou a sentar na cabeceira da mesa e quis comer franguinho com polenta. Aquele. Já do vaso de cristal ninguém sentiu falta.
Agora a família faz assim: comprou uma balança para equilibrar a rotina e a novidade. Ela ressuscitou e voltou a morar com eles, mas só durante a semana. Quando chega o sábado, faz sua malinha e some. Vai ver a rotina também enjoa das mesmas caras de sempre.
A partir daquele momento, nenhum dia seria igual ao outro. As manhãs poderiam começar com o jantar e terminar a noite com o lanche da tarde. Os armários da cozinha guardariam as toalhas de banho. A banheira estava livre para virar estante de livros. Alguém deu idéia de colocar grama na escada. E quem quisesse transformar a sala em quarto ou dormir com a cabeça nos pés da cama não precisava explicar por quê.
A ordem era esquecer a rotina, usar a louça de festa em dia comum e acender o abajur quando ainda não precisava. Se quisessem tomar sopa com garfo, bom para eles. Se inventassem de pendurar um quadro na geladeira ou de ter um sapo de estimação, nada contra. Só não podiam comer carne de panela toda terça-feira. Nem fazer o mesmo caminho para o trabalho, nem viajar para os mesmos lugares, nem ficar nos mesmos hotéis, nem tirar as mesmas fotos, nem cortar o cabelo do mesmo jeito, nem contar as mesmas piadas, nem usar as mesmas desculpas, nem repetir tantas frases iguais.
Com o tempo, mais combinações foram feitas. Naquela casa, os aniversários seriam comemorados em outros dias. E não valia cantar de novo o Parabéns. Quem sabe o Jingle Bells, talvez o hino do Brasil para variar. Bandeirinhas de São João poderiam ser hasteadas no teto – estava todo mundo cansado de encher balão. No meio da mesa, bolo de carne com velinhas. Ou torta de ervilha. Senão, uma mesa reservada em um restaurante que ninguém conhecia. De convidados, os estranhos da mesa ao lado. Mas poderiam também ser os velhos conhecidos com presentes novos. Um pé de pato para nadar na serra. Um aquário para o gato. Um poema escrito em papel de presente. Um brinquedo de criança para quem virou adulto demais.
Depois que todos enlouqueceram tudo, a casa ficou parecida com um circo. O marido achava que era a mulher, a mulher não achava mais seus brincos. Os filhos queriam ver um pouco de TV, aquela coisa comum de apertar o botão e trocar o canal. Então a família percebeu que estava com saudade da rotina. Até porque dormir com cobertor no verão e ventilador no inverno não era tão divertido assim. Sem falar que os sonhos mudavam tanto que a cabeça já não descansava. Então num almoço de domingo, o pai olhou para a lasanha de frutas, voltou a sentar na cabeceira da mesa e quis comer franguinho com polenta. Aquele. Já do vaso de cristal ninguém sentiu falta.
Agora a família faz assim: comprou uma balança para equilibrar a rotina e a novidade. Ela ressuscitou e voltou a morar com eles, mas só durante a semana. Quando chega o sábado, faz sua malinha e some. Vai ver a rotina também enjoa das mesmas caras de sempre.
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